Recordando, fevereiro de 1959


15 de Dezembro de 1955… Há já 3 anos decorridos que apareceu o primeiro número deste jornalzinho! Como o tempo corre, meu Deus! Parece que foi há um ano. Ao passo que avançamos na idade, mais curto nos vai parecendo o tempo.
A ideia da criação do jornal na mente do Padre Miguel, aquele homem cheio de vida, incansável, mexido, que durante os sete anos em que paroquiou a freguesia de Alquerubim, encheu esta terra de benefícios de toda a ordem: espirituais e materiais.
Eu ainda não alinhava bem o de quanto é capaz aquela alma grande, mal cabendo naquele corpo pequenino. Por isso, sem lhe manifestar o meu receio de um fracasso em tão larga empresa, prometi-lhe colaboração consentânea com a minha idade e as minhas possibilidades intelectuais. Todo o trabalho da fundação e todo o sopro vital que tem alimentado o jornal durante estes anos decorridos, têm sido obra quase exclusiva do Padre Miguel. Eu apenas lhe sugeri o título: «Mensagem» logo de início me pareceu o nome que melhor define a missão que o jornal se destinava a desempenhar entre os muitos emigrantes de Alquerubim que granjeiam o pão em terras estrangeiras da Europa, e na Ásia, África e América do Norte e do Sul, e na Oceânia.
E a ideia vingou, como todos estão vendo. O jornal apareceu e — mirablie dictu! — cresceu!
Mas não foi só o jornal a obra que ficou marcando a passagem do Padre Miguel por esta freguesia.
Muito antes, e desde a sua posse, ele vivia sob a dolorosa impressão do estado de ruína em que se encontravam certos acessórios internos e externos da nossa igreja, contrastando desagradàvelmente com a elegância do seu desenho, adquirida com a restauração que sofreu na segunda década deste século. Os altares, adornados com uma talha enegrecida pela pátina dos séculos, destoavam na brancura do templo; os muros do adro estavam a cair, desfazendo-se em caliça, etc., etc.. Mas aonde ir buscar o dinheiro? O restauro de todas estas obras era tarefa que iria absorver algumas dezenas de contos.
Para o Padre Miguel não havia impossíveis. O difícil tornou-se realizável. A generosidade de alguns paroquianos, tanto presentes como ausentes, aliada ao seu constante labor, quer realizando festas na Casa do Povo, quer ensaiando os grupos folclóricos para o cortejo do Ano Bom das Pastorinhas para obtenção de ofertas ao Deus-Menino — tudo serviu a este padre admirável para, com um sorriso de cristal e uma alma ardente de apóstolo obter dos seus paroquianos, de bom grado, as importâncias necessárias para mandar fazer o restauro, pondo tudo em estado de novo, dando à igreja outra fisionomia — de tal sorte, que até apetece estar mais tempo na igreja, consoante ouvi a um paroquiano. E muitas coisas mais, que é impossível enumerar nos limites desta singela crónica, fica a freguesia devendo, no domínio temporal, a este prior, que vai, por decreto da Hierarquia Eclesiástica, pastorear a freguesia de Águeda.
Mas a obra espiritual do Padre Miguel supera a material, como frisou, no seu discurso na sessão de boas vindas do novo pároco, o Sr. Juiz Nogueira de Lemos. Assim é, na verdade. Os benefícios prestados pelo Padre Miguel, no domínio espiritual, à freguesia, são mais edificantes do que os que deixou vinculados ao progresso desta terra, que ele serviu como se fosse sua e que o chora como se ele fosse seu filho.
Ainda menos cabe aqui, pela falta de espaço, que está nos seus limites, e pela natureza do assunto, enumerar esses benefícios. Toda a gente bem formada desta freguesia, que acompanhou a acção pastoral deste pároco, a conhece. Ela foi sem dúvida a sua rutilante coroa de glória, em que ficaram engastadas, como pedras raras numa preciosa joia, as suas grandes qualidades — aquelas qualidades que possui um bom pastor.
(in Mensagem de 15 de fevereiro de 1959)
António Augusto de Miranda

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